16 de Dezembro de 2012

"eeeee!"
TEMPORAMA
Clayton Junior
Nobrow Press, 2010
24 págs., tetracromia

De vez em quando abro um livro e, antes de o comprar ou ler, cheiro-o. Temporama cheira a Akira, de Katsuhiro Otomo, a edição da Meribérica tinha um cheiro peculiar a lápis de cera que teria a ver com o seu processo de impressão.
Temporama é uma bd de Clayton Junior, um ilustrador brasileiro sediado no Reino Unido, a sua primeira incursão numa narrativa mais longa e pertence à colecção 17x23 da editora britânica Nobrow Press.
Caracterizada por um traço simples e cores vivas, Temporama é uma história pouco subtil sobre a influência da tecnologia na nossa vida quotidiana.
O protagonista é um homem de meia idade, calvo e com óculos, que vive com o seu gato num apartamento cujos elementos centrais são um modelo em miniatura de uma cidade e um frigorífico vazio. Trata-se de um sujeito  passivo que, conforme se vê ao longo da história, se deixado ao seu intuito, entrega-se à inércia. Durante a história vê-se forçado à acção, sempre influenciado por forças externas, quer estas representem a Natureza ou a Tecnologia - as duas forças contrárias da narrativa - e é incumbido de libertar uma multidão (a que está representada na capa) da ilusão da aparência e de ter, literalmente, os pés atados pela tecnologia.
A revelação final, estilo fim de episódio da Quinta Dimensão (em inglês e para os puristas, The Twilight Zone), provoca no "herói" uma reacção que nos remete para o início da história e que sugere o fechar de um ciclo. A natureza cíclica era já prenunciada na ilustração inaugural da bd,  onde se vê o protagonista a correr dentro de uma roda para hamsters.
Em relação ao aspecto visual, o desenho e storytelling são bons e permitem uma acção fluída que, aparte as cores garridas que por vezes dificultam uma leitura mais clara, é fácil de seguir.
Portanto, apesar de algumas falhas evidentes, Temporama tem momentos fortes que justificam uma leitura mais atenta.

5 de Dezembro de 2012

"But first, mate with me human."
PROPHET VOL. 1 - REMISSION
Brandon Graham et al.
Image Comics, 2012
136 págs., tetracromia

Este volume colecciona os números 21 a 26 do recém reeditado Prophet. Uma continuação sem o ser, neste Prophet há uma distanciação nítida da estética da Image Comics dos anos 90, e, mais que isso, uma ruptura completa com os temas recorrentes do super-heroísmo. Agora é uma banda desenhada de ficção científica reminiscente de clássicos como Dune, sem a sua estrutura densa e pormenorizada, mais próxima das suas congéneres europeias em termos de enredo.
John Prophet é despertado de um longo período de hibernação para encontrar um planeta Terra muito diferente daquele que conhecia, povoado por alienígenas, mutações da flora e fauna endémicas, e sem quaisquer sinais  de civilização humana recente. John segue um plano que lhe é revelado em  sonhos, sem saber qual é o resultado que o espera. À medida que a narrativa progride conhecemos novas personagens, versões diferentes de John, que revelam muito lentamente como chegámos ao momento no início do livro e preparam-nos para o que aí vem.
O ponto forte do livro é o seu ambiente. A narração é feita na terceira pessoa e os diálogos são mínimos, há uma ecologia muito própria, pequenos pormenores são divulgados em relação às criaturas que existem nesta nova Terra sem se recorrer a uma descrição pura e dura. É tudo muito fluido e orgânico.
Se John é a personagem com a qual naturalmente nos identificamos num mundo de aberrações e criaturas fantásticas e culturalmente diferentes, como John descobre da pior forma ao intervir numa cerimónia de sucessão, é difícil para um leitor humano aceitar confortavelmente determinadas situações. Falo especificamente da sua interacção sexual com um(a?) alienígena (longe da imagem apelativa das escravas Orion de Star Trek) ou do seu recurso ao canibalismo. A verdade é que John já não se limita à humanidade que conhecemos, tem "melhoramentos".
Para o ambiente da história também contribuem as frequentes vistas panorâmicas que dão uma noção de escala que contextualiza John, o seu esforço e a sua posição naquele mundo. Infelizmente, esse aspecto visual fraqueja na última secção da história (excluo a curta de Emma Rios, pós-história principal). Giannis Milonogiannis é para mim o elo mais fraco nesta estrutura, o seu traço "mangaesco" não me parece ser o mais apropriado para a história que está a ser contada, mas vou ter de me habituar a ele, já que é agora o desenhador regular da série.
Brandon Graham surpreendeu com esta visão de Prophet, longe do anti-herói de Liefeld e do terreno mais que batido do mainstream americano. É uma obra de ficção científica que desabrocha muito lentamente, ao seu ritmo, e com uma personalidade muito própria.

14 de Novembro de 2012

"You're with me always, my shark kings."
THE SHARK KING
R. Kikuo Johnson
Toon Books, 2012
40 págs., tetracromia

R. Kikuo Johnson foi galardoado em 2006 com o prémio Russ Manning Most Promising Newcomer Award (incluído na infame cerimónia dos Eisner Awards) pela sua bd, Night Fisher.
Dois anos depois, Françoise Mouly, editora nos anos 80 da Raw (a mítica revista de bd) e, actualmente, do New Yorker, criou a Toons Books com o intuito de publicar bd de qualidade para um público algo negligenciado:  crianças.
O resultado da colaboração dos dois é o recontar de uma lenda havaiana - The Shark King - a história de Nanaue, o filho do deus-tubarão Kamohoalii e da sua esposa humana Kalei.
Só se pode elogiar o aspecto visual deste livro que, numa altura em que cada livro tem de ter uma identidade própria e um estatuto de objecto de culto (versus objecto de cultura?), se nota fazer parte de uma colecção. O padrão do menino com corpo de livro e cabeça de filactera (balão das falas na banda desenhada) estende-se da lombada até à capa e contracapa e deve ficar muito bonito junto aos seus colegas de colecção numa estante. O interior não fica atrás, com um traço que faz lembrar Alex Toth ou David Mazzucchelli ( na sua versão anterior a Asterios Polyp) e muito próximo (quase encostado) da ligne claire europeia. Um estilo colorido e fácil de seguir e entender, apropriado para a faixa etária a que se dirige.
Em relação à história, não há muito a dizer, é relativamente linear, sem grandes surpresas. A principal crítica prende-se à personagem Kalei. Numa sociedade que se auto-proclama cada vez mais igualitária no que toca a géneros, a representação do género feminino neste livro não é muito favorável. A mãe de Nanaue é um exemplo de  passividade. As situações flagrantes são o seu abandono por parte do marido e do filho, e o livro termina com uma aceitação serena desse abandono. Se quisermos justificar dizendo que se trata de uma reinterpretação fiel da lenda, então que dizer da omissão do canibalismo de Nanaue? Não é o melhor exemplo a dar às meninas...
Esquecendo isso é um livro bonito para crianças. Aliás, é bd bonita para crianças. Com o aceitar crescente da bd para graúdos, os miúdos andam a ser um pouco negligenciados ou, pelo menos, este tipo de banda desenhada não é tão publicitado. O que é preciso não esquecer é que a maioria dos actuais leitores de bd começou a ler em criança...



6 de Novembro de 2012

Uma capa, dois autores.
SOBREVIDA
Carlos Pinheiro & Nuno Sousa
Imprensa Canalha, 2012
56 págs., tetracromia


Sobrevida é a a obra conjunta de dois autores: Carlos Pinheiro e Nuno Sousa. Se o título a principio não parece fazer muito sentido, é na contracapa que a sua definição é mais aprofundada como "a qualidade de quem não vive" ou a "sensação de vida", que se encontram de forma mais ou menos evidente nas duas histórias que constituem o livro.
A primeira história, "A Noite" de Carlos Pinheiro, é a preto e branco, provavelmente desenhada por uma esferográfica e usa frases simples para descrever a acção e alguns pensamentos das personagens que funcionam como uma entidade colectiva. Após um jantar, um grupo de indivíduos começa um jogo de mortes fingidas que, após se fantasiarem, leva as personagens a percorrerem uma cidade vazia de pessoas, livres do reconhecimento de outros,  que lhes permite ter liberdade de fazer e ser o que lhes aprouver, até à chegada de um novo dia quando se rendem à inevitável vida quotidiana. "O Dia" de Nuno Sousa tem um ambiente menos metafórico, parece ser autobiográfico, pintado com lápis de cor e o recurso ao texto, por vezes com função de comentário social, é sempre monólogo interior da personagem principal (o autor?) mesmo quando este fala com o seu pai.
Embora visualmente díspares, cada uma com o seu virtuosismo técnico (ambos os autores são licenciados da FBAUP), há um intimismo e melancolia cúmplice que aproxima as duas narrativas criando uma sensação de coesão estrutural da obra. Como síntese desta afirmação temos a capa do livro: uma cena da história de Pinheiro é complementada muito naturalmente pelas cores de Sousa.
Mais um nomeado para os Prémios FIBDA 2012 (categorias de Melhor Álbum e Melhor Desenho), este mais satisfatório.

30 de Outubro de 2012

"I know."
Hän Solo
Rui Lacas
Edições Polvo, 2012
64 págs., monocromia

Quem se atrever, seja qual for a área de discussão, a falar bem ou mal de autores portugueses corre o risco de entrar em polémicas. Pode ser vítima de acusações de pertença a uma de duas correntes "filosóficas" antagónicas, o "nacional porreirismo" e o "bota-abaixo".
Confesso que antes de começar a minha leitura já tinha as minhas reservas em relação a este livro. A minha namorada, pessoa cuja opinião muito prezo, e usando as suas palavras, "não recomenda" este livro, aparentemente, a ninguém. Para quem se sentir ofendido pela sua opinião e sentir necessidade de algum tipo de justificação posso dizer que a leitura desta bd veio na sequência de outra leitura que lhe foi bem mais feliz ("O amor infinito que te tenho e outras histórias", de Paulo Monteiro), substancialmente diferente na sua composição e temas. Por outro lado, este livro foi nomeado para as categorias de melhor álbum, argumento e desenho nos prémios do FIBDA.
A leitura de Hän Solo trata-se então de uma questão de gestão de expectativas.
A obra de Rui Lacas tem uma amplitude incomum, vai de um realismo com elementos do fantástico ("A filha do Caranguejo" ou o mais recente "A Ermida", como exemplos) ao enredo típico de comic book americano (até agora 2 volumes de "Asteroid Fighters"), e, claro, de lembrar sempre, ter sido capaz, algo embaraçosamente para os nossos editores nacionais, de publicar o seu "Merci Patron" em França antes do seu homólogo português. Este  Hän Solo insere-se no grupo de histórias mais intimistas de base realista.
Regressando à questão das expectativas, fiz bem em mantê-las baixas, pois embora Lacas já nos tenha habituado a um traço cuidado e a uma boa composição de páginas, estas não redimem o que é uma história inconsequente. É uma narrativa pouco orientada, os eventos parecem suceder-se porque sim, e se para a personagem com quem Hän disputa um jogo de bilhar esta é a realidade com que lidamos e, como tal, um conjunto de frases feitas é o suficiente para a aceitarmos, para mim não. As personagens secundárias não estão bem desenvolvidas, a interpretação das suas acções foi deixada ao discernimento do leitor que tem uma elipse difícil pela frente. Se se tratasse de um relato autobiográfico compreender-se-ia esta perspectiva unilateral mas num registo ficcional é preciso um mínimo indício das motivações das outras personagens.
Outra questão é a representação da doença bipolar que não me parece fidedigna, é pouco explorada e julgo que se o fosse daria outra profundidade ao que foi contado.
Por fim, não há grandes consequências para Hän ou qualquer uma das personagens, o que também não me permitiu como leitor chegar ao fim e sentir uma mudança em mim provocada pela leitura.
A Cerimónia de Entrega dos Prémios Nacionais de Banda Desenhada realiza-se no dia 3 de Novembro, pelas 18h30,  nos Recreios da Amadora, e eu, espero, vou estar no público. Não é uma ameaça.

22 de Outubro de 2012

Fácies cushingóide.
I WILL BITE YOU! AND OTHER STORIES
Joe Lambert
Secret Acres, 2011
128 págs., tetracromia

Mais um entre muitos dos que se formam anualmente no CCS (Centre for Cartoon Studies), Joe Lambert tem neste livro a sua primeira publicação "a sério". Trata-se de uma colectânea de histórias curtas, umas que já foram publicadas sob a forma de minicomics ou em antologias, outras inéditas e feitas especificamente para aqui, que exploram um imaginário muito próprio povoado por crianças rebeldes, corpos celestes muito humanos, homens das cavernas transcendentes e tartarugas bateristas.
No total, 8 histórias, a maioria com um esquema de cores reduzido (as cores de eleição, amarelo, verde e cinzento), com alguns temas que as ligam tenuemente (a relação entre irmãos, lidar com a frustração, entre outras) e alguma violência gratuita sob as formas mais diversificadas.
O que mais sobressai no trabalho de Lambert é a sua apresentação gráfica acima da média, tudo tem o seu elemento visual representativo, desde as falas do protagonista da história  titular, os sons de brincadeira e da música na história "Mom Said", à batida da tartaruga na versão moderna da fábula de Esopo. A narrativa está em segundo plano e o enfoque é dado à estética, o que pode acontecer quando se está ainda a descobrir o funcionamento da linguagem da bd e como desafiá-la, por exemplo no uso dos balões na história "After School Snacks".
Se noutras leituras digo que fico à espera de algo mais, com Lambert não me posso queixar, lançou no início deste ano um livro com uma narrativa mais sustentada, Annie Sullivan and the Trials of Helen Keller, de 96 páginas, que não deverá desiludir tendo em conta o potencial demonstrado neste I Will Bite You!.
Enquanto não se compra o novo livro, pode-se encontrar mais deste autor na sua página pessoal: www.submarinesubmarine.com.

15 de Outubro de 2012

Vai estudar Relvas!
RASPA KIDS CLUB
Álex Fito
Ediciones Glénat, 2010
120 págs., tetracromia

Uma espécie de maçonaria para miúdos que morreram em circunstâncias trágicas, no Raspa Kids Club só entra a elite das crianças injustiçadas, sendo que a "elite" representa as que foram, de uma forma ou outra, vítimas dos seus pais.
O livro explora o mundo para qual são transportadas essas crianças, um parque de diversões distorcido pela morte. Álex Fito recorre a gags não muito sofisticados para dar-nos a conhecer a mecânica desse novo mundo e as relações que se estabelecem. O seu desenho, pelo contrário, é muito trabalhado na sua simplicidade, quase esquemático, denunciando, porventura, a influência de Chris Ware tanto nas representações do parque como nos pequenos textos que são interlúdio das bds. Em termos de cor, no mundo macabro do clube, as brincadeiras "inocentes" pertencem a um mundo colorido e suave e, no mundo "real", o preto e branco realça a situação infeliz das crianças.
As sequências mais eficazes são as que decorrem no mundo dos vivos, cuja temática é mais séria. Resumindo, nesses momentos da história são relatadas as vidas de cada uma das crianças, Nina com o papel principal, e como estas sofrem devido aos caprichos dos seus pais, sendo-lhes impossibilitada uma infância feliz ou normal, como preferirem. O momento alto, que bem poderia ser de filme de terror pela forma como foi composto (no sentido de composição de página, que embora não seja se calhar o termo mais correcto, não deixa de dar a entender o que quero dizer), vê Nina regressar à realidade dos seus pais no que parece ser um acto de vingança póstuma, quando nos é revelado que o que pretendia era resgatar o seu irmão in utero da mesma vida que viveu.
Se tem realmente momentos interessantes, estes infelizmente são escassos, e, embora tente ser inteligente, esta bd de Álex Fito desiludiu-me, embora bonita não tem substância.

7 de Outubro de 2012

Em ponto grande.
AVENTURAS DE UN OFICINISTA JAPONÉS
José Domingo
Bang ediciones, 2011
120 págs., tetracromia


Há cada vez mais autores de bd influenciados pelos videojogos da sua infância. Para além do exemplo paradigmático de "Scott Pilgrim" temos agora este "Aventuras de un oficinista japonés", de José Domingo, inspirado, porventura, nos role-playing games japoneses dos anos 90. Esta bd tem o mesmo tipo de estética e energia que caracteriza esses jogos, para além das suas personagens caricatas e um sentido de humor muito peculiar.
A história narra a saída do trabalho de um salaryman que no caminho para casa vê-se envolvido em situações cada vez mais absurdas e incríveis numa crescente de loucura e imaginação. Um dos episódios mais inusitados é aquele no qual o próprio autor tem que negociar, no seu inferno pessoal (Que outros autores inclui Domingo neste inferno?), com o seu demónio para que este ressuscite o protagonista de forma a poder concluir a sua história.
O desenho simples super deformed e as cores vibrantes distraem-nos da capacidade que Domingo tem de nos surpreender com pequenos sub-enredos à moda de Mortadello y Filémon de Ibañez ou a chicken fat de Elder na MAD que têm repercussões imediatas, de vinheta para vinheta, ou a médio e longo prazo. Estes pequenos brindes ajudam à longevidade de uma obra de leitura rápida.
Resumindo, "Aventuras" é uma bd engraçada e "muito bd" na sua forma de estar, mesmo indo beber a outras fontes como os videojogos, e que já atraiu a atenção da editora Nobrow que acabou de o publicar no Reino Unido.

29 de Setembro de 2012

Josée, a desejada.
FANFARE
Aude Picault
Editions Delcourt, 2011
90 págs., tetracromia

fanfarra 
(francês fanfare
s. f.
1. Música tocada por instrumentos de metal, geralmente em momentos de festa.
2. Conjunto de músicos que tocam principalmente instrumentos metálicos de sopro. =CHARANGA
3. [Informal]  Fanfarrice.
4. [Brasil]  Bravura, valentia, coragem.


in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa


Alda pertence a uma fanfarra entre muitas numa noite de festa e de bebida. Se inicialmente tinha como principal objectivo encontrar Bilou, quando descobre que este está de férias com a sua meuf (o verlan é uma gíria que consiste na inversão de sílabas de uma palavra, portanto, femme invertida, tendo em conta a pronunciação, é meuf), após um amuo inicial, começa a questionar a sua identidade e escolhas de vida acabando por se entregar ao carpe diem.
Fanfare tem um desenho simpático e cores suaves que são apropriadas à história contada, também simpática e suave mas, sinceramente, não muito profunda.
Para aqueles que não têm um grande domínio do francês e têm que recorrer a um dicionário de dois em dois minutos (o meu caso) há dois grandes entraves na leitura desta bd. O primeiro é o uso de um francês que não é o que nos é ensinado nas escolas, a gíria figura proeminentemente em toda a obra, o que não é necessariamente algo negativo, as personagens pertencem a determinado grupo etário e faz todo o sentido que usem determinadas expressões. O segundo é um dos elementos mais subestimados da bd - a letragem  - que talvez imitando a caligrafia da autora dificulta a leitura, mais ainda para aqueles que não conseguem dar o salto intuitivo pelo sentido da frase.
Embora a  temática não seja exactamente muito estimulante, o aspecto gráfico é muito bom. Aude Picaut é excepcional nas suas expressões faciais, minimalistas, que transmitem facilmente emoção, na sua decomposição do movimento das personagens que se "movem" de forma fluída e natural e no seu uso de cor para expressar sentimentos.
Se procuram uma leitura rápida e descomprometida com desenhos bonitos e "cartoonescos", Fanfare parece ser uma boa escolha. Por enquanto eu fico à espera para ver se Picault decide abordar temas mais complexos que também é preciso na bd.

27 de Agosto de 2012

O poder da palavra.
THE UNWRITTEN
Mike Carey & Peter Ross
Vertigo Comics, 2009-2012 (continua)

Tom Taylor é, à falta de melhor palavra, um falhado. Wilson  Taylor, o seu pai, escreveu uma série de livros infantis à la Harry Potter cuja principal personagem, Tommy Taylor, é inspirada no seu filho. Após o desaparecimento misterioso de Wilson, Tom vive de circuitos literários, assinando os livros do pai, dando palestras e tirando proveito financeiro da sua "relação" com Tommy. Quando um membro do público coloca em dúvida a sua identidade, o seu mundo desmorona e assim começa a sua história.
O que inicialmente poderia parecer uma versão adulta de Harry Potter revela-se algo mais, Carey pretende abordar a importância das histórias e como elas influenciam a nossa vida. Em Unwritten uma organização secreta manipula o resultado de acontecimentos importantes ao longo da História e fá-lo recrutando escritores talentosos para que estes desenvolvam narrativas de acordo com os seus preceitos, com repercussões bem tangíveis e reais.
Esta premissa permite personagens de luxo (como Rudyard Kipling e Oscar Wilde); uma espécie de "geografia literária" de locais que estão ligados directa ou indirectamente a obras conhecidas; o uso de personagens ficcionais (o monstro de Frankenstein, Lizzie Hexam de Our Mutual Friend); diferentes formas de escrita... Enfim, Carey tem à sua disposição um conjunto infinito de possibilidades a explorar.
O recurso a personagens de ficção não é algo novo na banda desenhada e não falemos das tradicionais adaptações de obras clássicas. Um exemplo recente e mais conhecido é The League of Extraordinary Gentlemen de Alan Moore e Kevin O'Neil, inicialmente uma ode à literatura vitoriana que entrosava num só enredo as inúmeras referências aos livros (e seus contemporâneos) de onde tirava inspiração. Ao contrário deste The Unwritten parece ter objectivo mais especifico e dirigir-se para uma verdadeira conclusão (ou pelo menos ter uma já planeada).
A arte de Peter Gross é funcional e consistente, não impressiona pela sua estética mas é sólida e aos poucos estabelece o que é o visual da série: enraizado na realidade mas ainda assim capaz de voos de imaginação. Se se cumprissem os preceitos de uma série tipicamente americana um desenhador mais "atraente", mais espalhafatoso, acabaria por abandonar a publicação por não cumprir os prazos e a consistência visual da obra estaria comprometida. Gross é seguro e até hoje as coisas têm corrido bem, sem atrasos.
De referir ainda as maravilhosas capas de Yuko Shimizu (por favor não confundir com a  homónima criadora da Hello Kitty!) que à primeira vista parecem ser o embrulho bonito (como as capas, antes de James Jean, agora de João Ruas, de Fables) para a série mas não se iludam, cada capa é um resumo perfeito do que se encontra no interior. Se bem que a ascendência de Shimizu é perfeitamente notória na sua arte, nas capas os protagonistas (especialmente Tom) têm um ar asiático que, se calhar, não concilia bem com o interior tão ocidental em termos estéticos e temáticos. Mas são tão bonitas...
Este mês saiu o número 40 de The Unwritten e só nos resta acompanhar os autores até a última paragem do que espero ser uma longa viagem.

9 de Agosto de 2012

Drifter.
RASL
Jeff Smith
Cartoon Books, 2008-2012
382 págs., P&B

Jeff Smith é conhecido pelo seu épico Bone, de quase 1400 páginas, sobre três primos expulsos da sua cidade natal que se vêem numa terra desconhecida onde princesas e dragões acabam por inevitavelmente enfrentar as forças do Mal.
Se estes parecem ser os trâmites familiares da Fantasia básica, Bone sobressai pela sua excelente caracterização das personagens, o seu sentido de humor e o talento de Smith como cartunista e, acima de tudo, contador de histórias. Inspirado por Walt Kelly (cuja influência é notória no desenho dos primos titulares), Carl Barks e J.R.R. Tolkien, Smith conseguiu que Bone fosse um sucesso estrondoso especialmente entre as faixas etárias mais jovens.
Após quatro anos (embora neste intervalo tenha feito a mini-série Shazam!: The Monster Society of Evil para a DC Comics), Smith regressa com uma nova história que se distancia radicalmente de Bone. Ao que parece Jeff e alguns dos seus amigos tinham combinado que as suas próximas bds seriam de ficção científica e assim temos RASL (e também Echo de Terry Moore). No entanto, não podemos considerar que seja uma obra de ficção científica pura já que também tira muito dos filmes noir dos anos 40-50 e dos mitos criacionistas norte-americanos.
RASL é a estória de um ladrão que visita realidades alternativas em busca de originais de pintores famosos para poder vendê-los a quem mais pagar. Com o desenrolar da trama descobrimos o verdadeiro nome (e o significado do pseudónimo) do protagonista, as circunstâncias que o levaram a esta situação e as suas reais motivações.
Como pano de fundo Nikola Tesla, cientista e inventor do fim do séc. XIX e início do séc. XX. Através da sua biografia é-nos fornecida a base "científica" e um dos elementos intercalares (e interessantes) da acção.
RASL acaba por se revelar uma história de amor e traição e aí entram as convenções do género noir, a narração em primeira pessoa, os flashbacks, a relação extraconjugal com a mulher do melhor amigo, entre outros (há mesmo uma quase citação do Maltese Falcon lá pelo meio e fim!). Entretanto, Smith tenta também abordar os temas da religião e espiritualidade recorrendo à mitologia índia norte-americana e a duas personagens bizarras, uma em particular com papel preponderante na conclusão da narrativa.
Juntando-se ao elenco excêntrico temos Sal, principal antagonista e contraponto do herói,  que parece representar o pensamento primitivo (até no seu aspecto físico reptiliano), ou antes uma perspectiva fixa da realidade que não deve ser questionada e que é superior a todas as outras.
RASL não se equipara a Bone, o equilíbrio que o segundo tem entre leveza e profundidade (que nem são antónimos) não acontece no primeiro. A intenção do autor é precisamente atingir um público mais adulto e afastar-se de um universo ao qual se dedicou durante 13 anos e que o vai perseguir para sempre. Em relação ao aspecto formal da obra, a composição e perícia de Jeff Smith mantêm-se: sabe contar histórias. E tem-me no seu público cativo.

10 de Junho de 2012

Hoje acaba o Festival Internacional de Banda Desenhada de Beja. De 26 de maio a 10 de junho, quem visitasse a Casa da Cultura de Beja podia ver exposições, assistir a apresentações de livros e discussões várias, pedir autógrafos e comprar uma ou outra bd no Mercado do Livro.
Num ano em que foram reduzidos inúmeros apoios financeiros para este tipo de eventos, os ditos culturais, falou-se em não haver festival. Felizmente ficou-se pelas palavras.
Paulo Monteiro, organizador do festival e autor de bd, responde ao repórter da TvL que o entrevista que com a ajuda de amigos conseguiu-se fazer um festival "internacional" só com autores portugueses. Quem o viu por lá, a correr de um lado para o outro, frenético, a carregar mesas, com ar preocupado, sabe que muito se deveu ao seu esforço e dos que o acompanham.
Concentrado na Casa da Cultura, ao contrário de anos anteriores que incluíam como espaços de exposições a Biblioteca Municipal, o Museu Jorge Vieira, o Museu Regional e a Casa das Artes, o festival tornou-se num evento mais caseiro. Quem quisesse numa tarde podia ver todas as exposições, assistir às apresentações, etc.
Das exposições destacavam-se duas: a de Maria João Worm, vencedora merecedora do Prémio Nacional de Ilustração 2011 pelo livro "Os animais domésticos" e a do fanzine Efeméride sobre Corto Maltese que levou a ambientação ao extremo: o chão coberto de areia, o som da maré e gaivotas que flutuam sobre a cabeça do visitante.
Lamentavelmente as apresentações exigiam a quem as assistisse chegar mais cedo - mais caseiro significa menos espaço - e de tempo muito limitado (15 minutos é para o aquecimento). Uma sugestão: se se aproveitasse o espaço do ateliê de fotografia podia haver discussões simultâneas e assim mais tempo e maior oportunidade de escolha nos temas.
Muito importante foi a programação paralela, porque nem só de bd vive o nerd, e na visita guiada à Villa Romana de Pisões teve o seu ponto alto.
Agora é só esperar mais um ano pelo próximo FIBDB e para saber quem será o recipiente do prémio autor revelação Geraldes Lino.

5 de Maio de 2012

Michael DeForge
A maioria dos prémios de bd estão associados a outro tipo de evento, nomeadamente, festivais, e baseiam-se em processos de selecção e voto que têm mais em conta a popularidade de uma obra do que a sua qualidade.
Os Doug Wright Awards evitam este tipo de viés através de um processo rigoroso que envolve júris de nomeação e júris de selecção. Estes  júris não se limitam a elementos próximos da bd mas a várias áreas da arte e cultura canadiana e, sim, alguns são autores de bd.
As peculiaridades não ficam por aqui. Os prémios dirigem-se  às publicações canadianas anglófonas e há "somente" 3 prémios.
Há uma atitude diferente e séria que contrasta com o mercantilismo comum na "indústria" norte-americana e na maioria das cerimónias do género.
                                                                      Prestemos atenção.

21 de Abril de 2012

bd-SM?
MARÇO ANORMAL
Tércio de Vina
Edições El Pep, 2010
82 págs., tetracromia

"Uma pitada de mestria operária das Caldas com o nonsense de "Monty Python": assim se define "Março Anormal."" ou assim o define Nuno Duarte numa das abas da capa.
Escrito e desenhado por João Tércio de Vinagre Guimarães, aliás, Tércio de Vina, o livro está dividido em 3 actos, cada um protagonizado por uma das 3 personagens cujas histórias acabam por se entrecruzar progressivamente.
No primeiro acto acompanhamos Marco Manias que após um encontro sexual menos feliz, desenvolve uma infecção que o deforma de maneira muito particular. 
Tal qual Gregor Samsa se depara com a sua metamorfose ao despertar, Marco descobre que possui agora um falo de dimensões sobre-humanas que o fará alvo de exploração num negócio obscuro de cosmética.
Frederico Simões, vulgo Freakin Fred, para além de ser capa do livro, é actor de "artes performativas alternativas" com formação circense, insensível à dor e autor de um massacre pelo qual é finalmente confrontado no segundo acto, encontra Marco após a sua fuga para uma floresta, sendo salvo pela sua "coisa" de um javali devorador de carne.
No acto final é-nos apresentado Óstro, típico herói musculado, acéfalo, ídolo da populaça e pai da jovem Josefina, transmissora da infecção transmutadora a Marco. É na sua senda por vingança, em defesa da honra da sua filha, que são reunidas todas as personagens e temos uma resolução para as suas narrativas.
O livro encontra-se pejado de referências à pop culture - o jogo Mortal Kombat ("Come over here!", pág. 23); Ferrero Rocher (o Ambrósio); Rambo (Óstro); o filme A Few Good Men ("O papá quer a verdade? O papá não agueeenta a verdade", pág. 73); Astérix (o banquete na última página) e uma ou duas letras musicais para ambiente - e, infelizmente, também de erros ortográficos e (dois) erros na balonagem. Se as primeiras fazem com o leitor sinta que  a obra pertença a um universo maior, os segundos fazem com que, eu pessoalmente, esboce um esgar de dor.
Concordo parcialmente com Nuno Duarte, a pitada de Caldas está cá, o absurdo inteligente dos Monty Python é que não.
Há muito por onde o autor podia pegar em termos de crítica social e sinto que nesses termos é um livro desaproveitado.
Mas nem só de mal vive o livro.
Em termos visuais é muito bom, um estilo de desenho com um piscar de olhos a Laerte, a coloração impecável (de Rui Lacas e Ricardo Tércio), as sequências excelentes de vinhetas (como exemplos as páginas 47 e 67). Razões que me fazem ainda mais difícil aceitar que foi uma leitura que me decepcionou.
A título de curiosidade, ao contrário de outra crítica não creio que o título do livro provenha de Marco, que após a sua transformação física passa a ser um "Marco anormal" - embora seja bem pensado - mas antes pela referência na primeira vinheta do terceiro acto que contextualiza a acção no tempo.
O tempo anormal no qual vivemos.

16 de Fevereiro de 2012

A tradição espanhola de estar acima da realidade.
BARDIN THE SUPERREALIST
Max
Fantagraphics Books, 2006
82 págs., tetracromia


Buñuel, Dali e Capdevila. Se os dois primeiros nomes são reconhecidos como pertencentes a dois mestres do surrealismo, este último nem por isso. Francesc Capdevila é já um dos veteranos da bd espanhola, tendo uma longa carreira iniciada nos anos setenta sob a forte influência, como não poderia deixar de ser, do mítico deus do underground americano R. Crumb. Com o tempo o seu estilo foi mudando e a marca do  atoomstijl (vertente da ligne claire de Hergé), cujo expoente máximo, Yves Chaland, é assumido pelo autor catalão estar ao nível de Crumb como fonte de inspiração,  alterou completamente o aspecto dos seus trabalhos. Bardín existe dentro deste novo universo visual de Capdevila e é uma personagem à qual o cartoonista regressa, ao ponto de coligir um livro de 80 páginas sobre as aventuras filosóficas do amante de conhaque. 
Já agora, Capdevila é mais conhecido no mundo bedéfilo pelo pseudónimo Max e é responsável pela mascote do Barcelona (a equipa de futebol) e algumas capas da revista New Yorker, afirmando-se como grande ilustrador e designer - recomendo o livro Espiasueños, editado pelas Ediciones La Cúpula em 2003, onde se encontra coleccionada grande parte do seu espólio artístico até essa data.
O livro começa com uma passagem de testemunho, o cão andaluz, protagonista deserdado do filme de Buñuel, apercebendo-se da sua morte iminente, escolhe Bardín como herdeiro dos poderes surrealistas que roubou aos que o injustiçaram (Buñuel e Dali). É com esta nova perspectiva sobre a vida que Bardín reinterpreta os mistérios do quotidiano e desafia os desígnios divinos.
São 80 páginas de dissertação ora filosófica ora humorística, com recurso a referências e princípios surrealistas e de diversidade estilística, se numa instância podemos ter uma sequência com mais texto que a bd típica, noutro temos uma sem uma palavra que seja. É com esta versatilidade que Max mostra o seu domínio sobre a arte, o desenho é, como já disse, pertencente à linha clara, muito simples e, perdoem a redundância, claro, fácil de apreender e de compreender.
Há também variedade temática, abordando-se os múltiplos temas que reflectem a existência humana: racionalidade, solidão, o constructo da realidade, liberdade, religião, amor,  a morte; Max chega a ser referido numa das histórias, foco da ambiguidade emocional de Bardín.
Há uns quantos momentos que brilham ao longo de todo o "texto gráfico" e, seguidamente, enumero alguns que gostei particularmente: o discurso anti-institucional e promotor da banda desenhada; o representante do humor do episódio "Enlightment"; a referência ao 31 de março e a barbárie destrutiva e vingativa pelo mundo dos sonhos até contra o próprio Bardín.
Francesc Capdevila é actualmente um dos mais interessantes e completos autores de bd e Bardín é a conjunção das suas várias influências que coalesceram num produto único e com estilo próprio.

15 de Fevereiro de 2012

Amor paterno.
MI PEQUEÑO
Olivier Schrauwen
Normal Editorial, 2009
55 págs., tetracromia


São sempre marcadas pela surpresa as minhas visitas a alguns portais de banda desenhada espanhóis. A surpresa advém da diversidade e qualidade das coisas que lá encontro.  É que os "nuestros hermanos" cultivam um mercado editorial de bd que não acusa a sua proximidade geográfica à nossa "mercearia de bd".
Há dois anos recebi como prenda de aniversário um volume massudo do Little Nemo, de Winsor McCay, uma obra-prima do início do século XX, nos primórdios da arte, que primava pela sua estética deslumbrante e o seu assunto surrealista. Confesso que mal toquei no tomo, não por falta de interesse mas pelo medo de o estragar, até hoje mantém o plástico que o envolve, de vez em quando tiro-o religiosamente e faço os possíveis para não danificá-lo com um olhar demasiado abrasivo.
Embora aparentemente sem ligação, os parágrafos anteriores têm em comum este "Mi Pequeño". Passo a explicar.
Olivier Schrauwen é belga, não como as bolachas mas como os nativos da Bélgica, mas em vez de recorrer ao longo e nuclear património da bd belga (não é à toa que usamos o termo franco-belga para falar de  um tipo de bd), decidiu atravessar o oceano para encontrar a sua inspiração para este livro. Winsor McCay, Richard F. Outcalt e George MacManus são os nomes citados na nota biográfica do autor e, para além de serem alguns dos grandes pioneiros da bd americana, parecem também ter possuído Schrauwen, notoriamente, pelo aspecto e estrutura desta bd.
A esta "pureza" de estilo gráfico contrasta-se o seu conteúdo, esse sim, de Schrauwen, que chega ao ponto de ser macabro, com mortes inúmeras e violência gratuita. A intercalar (aqui exagero) o mórbido, a história de um pai e um filho e da sua relação através de aventuras episódicas que mimetizam na perfeição os velhos mestres: no traço, nas cores esbatidas, na ausência de calhas e até nos balões rectangulares. Há pequenos pormenores como o capítulo inaugural, referência a uma era anterior da bd e como, entre cada capítulo, as ilustrações esquemáticas que parecem pertencer a manuais ou revistas científicas dos anos cinquenta.
E o humor, de um absurdismo hilário a um sadismo delicioso que faz rir à gargalhada. A caricatura de criança que é o filho, imutável desde o nascimento e que leva ao desespero do seu pai no último episódio quando começa a crescer e envelhecer sem freio. 
A narrativa atinge o seu clímax na ida ao jardim zoológico, Schrauwen aumenta a parada e continua até à genialidade, surpreendendo com a sua capacidade para ligar vinhetas e personagens, literalmente neste último caso.
É igualmente curioso que consiga notar semelhanças físicas entre o bebé e Jimmy Corrigan, personagem de Chris Ware - que mais que autor é um estudioso da bd -, será partilha de herança memética?
Em suma, uma bem conseguida e bem-humorada homenagem a um passado que poucos, mas em número crescente, vêm a recordar com saudade.

14 de Fevereiro de 2012

HIERONYMUS B.: 1997-2007
Ulf K.
Top Shelf Productions, 2008
58 págs., P&B

É dentro de um mês (dias 10,11, 17 e 18 de março) que se vai realizar no Porto o Festival MAB Invicta, um regresso muito merecido ao norte do país de um evento que apesar do nome centra-se principalmente em bd. No meio da miríade de autores convidados, há um nome que reconheço: Ulf K., um alemão com  obra já editada em Portugal pelas mãos das Edições Polvo.
Decidi então que esta seria uma boa altura como outra qualquer para me familiarizar com o trabalho de Ulf. Das duas bd's publicadas em Portugal pela editora tentaculada só conhecia uma, nomeadamente, "A primeira Estrela e outras histórias", de 2003, a outra é uma colaboração com  o argumentista Andreas Dierssen: "O ano em que fomos campeões mundiais" (desconheço-lhe o ano), que por casualidade encontrei, tanto uma como outra, numa daquelas feiras do livro esporádicas na estação do Oriente. Escolhi a primeira para ler e a outra ainda por lá deve estar.
Outra bd que conhecia do alemão era "Hieronymus B.: 1997-2007", esta editada por inúmeras casas mas a que me era mais acessível era a versão americana da Top Shelf Productions e é por essa que começo.
Portanto, "Hieronymus B." é uma colectânea de histórias curtas produzidas no intervalo de uma década que são protagonizadas por um escriturário homónimo do pintor quinhentista Bosch.
As histórias têm um elemento onírico, com regras próprias, muito semelhantes aos contos infantis, também sugerido pela antropomorfização dos elementos naturais, por exemplo, as nuvens que têm por sua vítima de eleição B., entre os vários antagonistas é mais proeminente o seu chefe, autómato da realidade, que tenta ancorar B. à mesma, mais propriamente ao seu trabalho, mas com diferentes graus de sucesso .
Ao longo da obra nota-se a evolução no traço de K., à medida que estiliza o desenho da personagens, elas adquirem um ar mais infantil e "sólido", o tal icónico que McCloud refere. Não é à toa que Ulf K. ganhou o prémio Max und Moritz para melhor autor alemão em 2004, o contraste eficaz entre preto e branco, a sua narrativa (muda!) fluida que faz com que o livro se leia muito rapidamente.
Talvez a única crítica ao livro (que não foi pensado como tal) é que é uma colagem das várias histórias e, embora tenha uma temática recorrente, não funciona bem como unidade. Sabe a pouco.

A PRIMEIRA ESTRELA E OUTRAS HISTÓRIAS
Edições Polvo, 2003
48 págs., P&B

Dentro de um caixote pequeno, enterrado no meio de inúmeros títulos da Polvo a preço reduzido , estava "A primeira Estrela e outras histórias". Já o tinha visto antes, quando a bd estava espalhada em cima da mesa, lá ao fundo, e agora tinha a desculpa para o comprar. Era o último.
Desta vez o que liga cada uma das histórias não é o seu protagonista mas antes a temática.
A noite é a constante, seja pela sua personificação ou dos seus componentes, seja como motivação das personagens.
Aqui não há só a pantomima como em "Hieronymus B.", mas o uso de palavras não deixa de ser meramente acessório (o que é bom, implica grande mestria), excepto talvez nas últimas páginas onde o autor, como personagem, tenta transmitir uma noção pessoal. Se calhar a sua visão do mundo e da sua obra.
Mesmo assim repito o que escrevi antes: sabe a pouco.
Espero um dia ler algo mais longo do cartoonista que lhe permita  aprofundar os temas que lhe são queridos. E daí, talvez seja isso mesmo que ele quer fazer com as suas histórias curtas coligidas.

6 de Fevereiro de 2012

A prova de que o tamanho interessa.
GEORGE SPROTT: 1894-1975
Seth
Drawn & Quarterly, 2009
96 págs., tetracromia

Há duas edições de George Sprott: 1894-1975, uma em capa dura e outra de capa mole, as duas são em formato grande (pelo menos maior que o formato típico norte-americano), sendo a de capa dura maior (12x14 polegadas, aproximadamente, 30x35 cm). Isto pode parecer ser uma questão de pormenores mas este livro faz-se disso mesmo.
George Sprott é uma celebridade de terceira categoria que apresenta um programa num canal regional, um talk-show onde entrevista o convidado do dia e  revive glórias passadas sob a forma da exibição de antigos filmes seus de antigas aventuras suas no Ártico. George é também o protagonista do livro, se bem que o é mais de forma passiva. Trata-se do relato da sua morte intercalado por uma série de entrevistas a conhecidos e a familiares, memórias passadas e, em dupla página (portanto, 30x70 cm), paisagens gélidas e etéreas. Não é o usual elogio fúnebre, aqui não se doura a pílula, acompanhados por um narrador que se diz omnisciente mas que ao mesmo tempo admite não ter todos os factos sobre o sucedido, cheio de incertezas, é nos traçado o perfil do personagem, o bom e o mau. Aos poucos construímos George, basta seguir as pistas.
É mais um livro deslumbrante de Seth (Gregory Gallant) que já nos acostumou à minúcia e à nostalgia. E tudo é minúcia e nostalgia no livro, desde o seu desenho simples, reminiscente dos cartunistas do início do século XX, até às fotografias de pequenas maquetes dos diferentes prédios que marcaram a vida de Sprott, coisa que me esqueci de referir antes. Mais, é usando o que andam por aí a chamar de decompression (descompressão narrativa?, cada vez mais comum na bd norte-americana e já alicerce no manga), que Seth nos instila o passo lento de uma vida, o "regresso doloroso a casa".
Voltemos à questão do formato. Foi fundamental a panorâmica da abertura do livro - foi pensado, só pode - que traz consigo todos os benefícios à leitura de uma bd que tanto depende do sentimento de solidão e isolamento. 
Já agora, esta bd é uma versão redux da história que decorreu na secção The Funny Pages do    New York Times, e tendo em conta o conteúdo, isso sim, é mesmo engraçado.

29 de Janeiro de 2012

A profeta Marjane.
PERSEPOLIS
Marjane Satrapi
Jonathan Cape, 2006
344 págs., P&B


É muito difícil não fazer comparações entre Maus e Persepolis, especialmente tendo em conta o intervalo entre as duas leituras. Ambos são biográficos, debruçam-se sobre o tema da guerra e são a preto e branco mas enquanto o primeiro parece afastar-se do registo da biografia para entrar no campo documental, o segundo parece bem alicerçado no género biográfico e, de certa forma, é a sua maior fraqueza.
Em Persepolis, Marjane Satrapi relata a sua vivência enquanto iraniana e vítima de opressão de um estado intolerante muçulmano.
Ao contrário de Maus em que há um filtro externo - nesse caso é Art Spiegelman que pensa sobre a vida do seu pai e no livro expõe essa vertente reflectida da narrativa - o filtro de Satrapi é o tempo, ela é a protagonista da sua história.
Originalmente publicado em 4 volumes pela editora francesa L'Association, o livro divide-se em duas partes: The Story of a Childhood, que, como o nome indica, abrange a infância até a sua saída do Irão e The Story of a Return, sobre o seu regresso a casa após as suas experiências em Viena.
O desenho simples, a preto e branco, não é de um virtuosismo desmedido, se há momentos eficazes de storytelling/découpage, a verdade é que não entusiasma.
Em relação ao que é contado, à parte a revisão histórica e religiosa do Irão, a descrição do clima sufocante de perseguição e de censura, a luta e rebelião evidente e oculta, tudo se centra na figura de Marjane: criança-profeta, adolescente-punk e mulher-artista. É aqui que as coisas começam a desinteressar-me.
Não consigo lidar bem com os pequenos episódios de drama pessoal e adolescente, mesmo que se passem na adolescência de Marjane. Não me identifico. O que faz sentido, a protagonista é do género feminino, nunca chega a fazer parte da faixa etária em que me encontro e está a passar por coisas que nunca vivi: perseguição religiosa e intelectual, consumo de drogas, etc.
A verdade é que já tinha visto o filme antes de ler a bd (que chega a ser mais eficaz em determinadas sequências, um exemplo, o crescimento disforme de Marjane), claro que ser a seguir ao Maus também não ajudou, acredito que provavelmente terei uma melhor opinião numa segunda leitura. Portanto, espero poder dizer mais algo nessa altura.

14 de Janeiro de 2012

The last pamphlet.
OPTIC NERVE 12
Adrian Tomine, 2011
Drawn & Quartely
41 págs., tetracromia

Adrian Tomine era o menino-prodígio da banda desenhada alternativa americana, as histórias curtas introspectivas, com protagonistas diversos (tanto em género como faixa etária e estatuto social, que vem a desenvolver na Optic Nerve conseguiram alcançar notoriedade para que o artista tenha conseguido ilustrar para o conhecido The New Yorker, não que seja mais válido que fazer bd mas pelo menos tem mais prestigio (ver origem latina da palavra).
Neste número de Optic Nerve as coisas mudam, o comic está dividido em três secções (quatro se incluirmos a letter column), as narrativas são mais longas e há até um momento autobiográfico.
 Na primeira secção "A BRIEF HISTORY of the ART FORM KNOWN as "HORTICULTURE"" (págs. 05-23 ),Tomine diverge do que nos habituou, embora haja momentos de introspecção e análise em relação ao que é arte e o seu público-alvo, há uma aproximação em relação às daily strips dos jornais, tanto em conteúdo como em estrutura, aliás, na estrutura é flagrante, temos seis agrupamentos de quatro vinhetas cada, a preto e branco, que acabam com uma punchline e que, apesar de poderem ser lidas como uma unidade, permitem continuação para a unidade seguinte. Estas seis unidades (representativas dos seis dias da semana) são seguidas por uma página inteira, a cores, a emular as gigantescas sunday pages de outrora. O seu estilo de desenho está também simplificado, próximo do que vimos no "Scenes from an Impending Marriage: a prenuptial memoir", que parece ser agora o traço preferido do autor e que favorece a comicidade da história, para além de nos recordar de Peanuts ou Calvin and Hobbes.
 Na segunda secção "AMBER SWEET" (págs. 27-37), regressamos a algo mais típico, com traço mais apurado e limpo (e a cores!), acompanhamos uma coincidência que modifica a vida da protagonista e que, na minha opinião, se revela a menos interessante do comic mas que não deixa de ser visualmente bonita.
A terceira secção (págs. 40-41) é autobiográfica, nela a explicação do porque Tomine continua a usar o formato comic como meio de expressão. Enquanto que inúmeros dos seus colegas optaram pelo livro de capa dura, a opção estética (como tenta descrever antes de ser interrompido) é  discutida em duas páginas com exemplos de conversas e situações de carácter humorístico.
Adrian Tomine deixou de ser o menino-prodígio da bd alternativa americana impondo-se como referência pelo seu estilo de desenho acima da média e as suas personagens representativas de uma geração. Esta edição mais recente de Optic Nerve é uma homenagem ao que veio antes, seja historicamente (em relação à bd), seja pessoal (em relação ao passado do autor), que o reafirma como autor de comics mais que de graphic novels normalizadas de capa dura. Não é de admirar, há motivos para orgulho.

11 de Janeiro de 2012

175113
THE COMPLETE MAUS
Art Spiegelman
Penguin Books, 2003
296 págs., P&B


Maus relata a história da sobrevivência de Vladek Spiegelman durante a Segunda Guerra Mundial, contada pela mão do seu filho, Art.
É com este livro, inicialmente publicado em dois volumes  em 1986 e 1991 (e julgo antes até em capítulos na revista de bd artística de  Spiegelman, Raw), que Art Spiegelman atinge o estatuto que ainda acompanha o seu nome e é também com ela que a banda desenhada americana alcança reconhecimento como forma de expressão adulta, ganhando um prémio Pulitzer.
O que nos é contado divide-se em dois momentos diferentes: no presente, somos testemunhas da relação conflituosa de Art com o seu pai e onde o autor divulga ao que se propõe, as suas inseguranças em relação  ao projecto e à representação que faz do pai e do Holocausto; no segundo momento presenciamos a luta pela sobrevivência de Vladek e da sua família, judeus polacos, no ambiente inumano da altura. Há momentos de verdadeiro horror, sempre em primeira pessoa, a voz de Vladek (voz essa com uma representação muito própria, Spiegelman-autor decide manter as incorrecções no inglês do pai) conta-nos cada vivência, cada momento, e se há viés no que é dito, conseguimos perceber de onde vem, pois passamos a conhecer Vladek intimamente, as suas respostas passam a ser naturais.
Um dos pontos que definem este "texto gráfico" é a escolha de representar cada uma das diferentes nacionalidades/etnias por um animal específico, a escolha - rebelde - do rato para os judeus parece óbvia após ler a citação na página 164, embora pareça ser uma forma de despersonalização, esta representação aproxima-nos ainda mais das personagens, estamos mais atentos ao que dizem e à sua linguagem corporal, para além de que foi o povo judeu a ser oprimido e não um indivíduo especifico.
O preto e branco objectiva o relato, a simplicidade do traço é enganadora e propositada, podemos até compará-lo com o da "bd dentro da bd" (págs. 102-105) em que o desenho é mais pormenorizado e carregado, mais escuro, e mais pessoal (relativamente ao autor), embora a restante obra também o seja, parece tentar ser mais abrangente.
Na segunda metade do livro (o segundo volume), são-nos apresentadas as consequências do primeiro volume, Art Spiegelman representa-se com a máscara de rato (não será mais judeu mas alguém que o finge ser? Ou é visto como tal?) e por debaixo de si os cadáveres das vítimas do Holocausto, a base do seu sucesso e agora também da sua culpa pelo mesmo e pelo uso deste tipo de material e na sua regressão a uma corpo infantil quando confrontado com as pressões inerentes a esse sucesso. É também nesta altura que Spiegelman-autor tenta chamar a atenção para o formato da sua mensagem (na sua conversa com Françoise, no carro - pág. 176), a bd, e a forma como ela limita e molda a mensagem a transmitir.
De forma honesta e algo neurótica, Art Spiegelman, demorou treze anos a concluir a sua obra-prima, confrontou o seu passado e a sua relação com o pai e permitiu-nos como leitores a perceber até que ponto estamos próximos da catástrofe e da salvação. E tudo isto através da banda desenhada. Dá que pensar. 

8 de Janeiro de 2012

A capa do Premio Nacional del Cómic 2008.
ARRUGAS
Paco Roca
Astiberri Ediciones, 2007
104 págs., tetracromia

Chegamos a um ponto no nosso desenvolvimento como sociedade em que as reformas de valores ocorrem a intervalos cada vez mais curtos e a mudança de paradigmas é cada vez mais comum. A identidade de uma pessoa é construída com base em todas as suas experiências e vivências, é um processo moroso e continuado que leva anos a chegar ao fim, se é que alguma vez termina. Ser idoso actualmente não traz o mesmo tipo de respeito que trouxe no passado, se antes era ser alguém que desempenhava a função de sábio, de orientador na vida dos seus familiares, um papel preponderante na comunidade que ainda acontece nas civilizações "menos desenvolvidas", agora, no ocidente, as pessoas são tratadas como fardos incapazes (parafraseando Miguel). Não digo que seja a regra ou a sua excepção mas que há cada vez uma visão menos positiva em relação à velhice. Acompanhar a rapidez a que o mundo muda não é fácil e menos ainda a alguém cuja fundamentação do real está ultrapassada (ou estará?), nessa fase da vida em que o corpo nos falha (algo tomado como natural), sentir que estamos a perder faculdades mentais é ainda mais assustador, pois é tudo o que nos define e o apoio que antes era dado pelo ambiente familiar agora é relegado a instituições especializadas. 
Neste livro Paco Rosa reúne algumas das histórias que foi recolhendo entre amigos, conhecidos e na sua própria família e fá-lo de uma forma cativante e ternurenta. Emílio, a personagem que acompanhamos ao longo da narrativa, inaugura-a precisamente com um episódio de desorientação - vive um momento passado na sua juventude sem ter noção do presente - que parece ser o culminar de uma sucessão de eventos que força ou permite a que o seu filho tome a decisão de o deixar num lar. Aí Emílio conhece o cínico Miguel e uma série de outros idosos que habitam a instituição, cada um com uma característica que os define e identifica. Aos poucos, percebemos como funcionam os horários e movimentações dentro do lar e como Emílio vai perdendo as suas capacidades.
Nesses períodos de descontextualização, Emílio e os outros residentes vêem-se em situações que nos revelam um pouco sobre o seu passado e são os momentos-chave de caracterização das personagens. Conseguimos compreender a importância destes momentos e as motivações de cada um, personalizando-os, dando-lhes uma voz interior, tornando-os humanos. Em cada um destes episódios há uma regressão em relação à imagem pessoal mas o aspecto físico dos outros é como os vêem, portanto, temos acesso à forma como cada um se vê.
Em toda a obra há momentos de ternura e de humor, sem que estes minimizem os momentos de desespero e terror de Emílio à medida que se vai apercebendo do que lhe está a acontecer.
O desenho de Paco Rosa é simples e directo (que deve ter facilitado a sua recente adaptação ao cinema de animação), tem um bom entendimento de storytelling e de expressões faciais.
Resumindo, Arrugas é uma bd bem-feita, há um enredo simpático, bem fundamentado em termos científicos e, especialmente, em   relações humanas.

6 de Janeiro de 2012

Lucia revela-se.
CINQ MILLE KILOMÈTRES PAR SECONDE
Manuele Fior
Éditions Atrabile, 2009
144 págs. , tetracromia

Lucia  e Piero são dois adolescentes italianos que se conhecem quando a primeira, devido ao processo de separação dos pais, vem morar para o mesmo bloco de apartamentos do segundo. 
Longe de ser a história de amor típica que Hollywood nos impinge ad nauseam, a narrativa acompanha os protagonistas ao longo de 20 anos, os seus encontros e desencontros, as decisões que fazem ao nível das restantes relações nas suas vidas, até ao momento da sua separação final.
O traço espontâneo de Manuele Fior coaduna bem com o tom intimista do enredo, as suas aguarelas impõem o ambiente da narrativa, variando das cores quentes do episódio inaugural às paisagens gélidas da Noruega, mais até que o próprio texto. Aliás, é um livro "leve" tendo em conta aquilo que é contado, há uma superficialidade das personagens que, embora nos permita preencher os espaços em branco, nos faz questionar as suas motivações e torna-as ambíguas e, portanto, difíceis de compreender.
Só queria realçar as páginas que culminam com o beijo de Lucia e Sven, em pano de fundo o filme The Sword in the Stone, que mostra que na bd se pode "citar" outras formas de expressão de forma eficaz e reconhecível.